segunda-feira, 24 de setembro de 2012

O lamentável erro de Emir Sader

Frequentemente, o grande equívoco do "magister, sociologiae" é acreditar-se menos professor e mais magistrado das ideias públicas, enfermidade que nos assola à direita e à esquerda.
Quando expõe uma frustração pessoal, o equívoco veste a fantasia do dogma. Não importa se um ou outro pode submeter a opinião ao crivo epistemológico. O que vale, nesses casos, é a autoridade do mestre.
Despertamos nesta segunda com a lamúria do senhor Emir Sader, eminente pensador da esquerda brasileira:
- Favorecer o Corinthians sempre faz parte da política social do governo de opção preferencial pelos pobres?
O chororô de torcedor provocaria risadas e outras provocações fraternais se não ocupasse lugar em página cujo bordado inclui análises acadêmicas do cenário político, críticas à mídia hegemônica e, enfim, propaganda eleitoral.
Ali, como previsível, o debate instaurado foi outro. Reacendeu preconceitos, gerou desconforto e exibiu arrogâncias e desconhecimentos.
Não é de hoje que a intelectualidade brasileira irrompe no mundo do futebol, ditando sentenças.
Lima Barreto fundou Liga Brasileira Contra o Futebol, argumentando que o esporte desencaminhava os jovens e insultava as tradições brasileiras.
Em sua estocada lamentosa, Emir Sader excede-se no erro, o que, pelo via da comparação, parece perigoso a quem empenha sua pena, diariamente, na análise da política nacional.
Primeiramente, a qual "governo" alude o intelectual? Seria àquele que ele próprio apoia em sua incansável militância?
Se a resposta é "sim", convém que alerte seus pares da urgência de uma reforma ética na condução das arbitragens.
Resta cá uma dúvida, será que Dilma Rousseff reúne regularmente seus ministros para estabelecer estratégias de afago ao Corinthians e ao Flamengo (outro clube citado por Sader em seus comentários)?
Estranha também que Sader tenha pinçado da fustigada ala progressista da Igreja Católica um termo para destilar seu veneno dominical.
Será uma crítica velada (ou nem tanto) às ações pastorais desenvolvidas no Brasil por Dom Paulo Evaristo Arns, por Dom Helder Câmara e pelos irmãos Leonardo e Clodovis Boff?
Provavelmente, não. Mas é certo que a frase cabeçuda de Sader não traduz respeito pelo trabalho de seus confrades na esquerda.
Horas depois da postagem, Sader foi educamente repreendido por Mônica Toledo, advogada, corinthiana, mas também petista, neta de um operário que trabalhou por 50 anos nas Indústrias Matarazzo e serviu Prestes como guarda-costas voluntário.
O debate, que agora foi apagado do Facebook (infortúnio técnico?), mostra um Sader persistente na retórica de desqualificação do objeto de análise.
Curiosamente, sua tática de argumentação não difere muito daquela dos próceres da direita conservadora em Veja e Folha de S. Paulo.
Cabe informar que a indignação de Sader tem relação com um complicadíssimo lance ocorrido no primeiro tempo da partida entre Botafogo e Corinthians, no Rio de Janeiro.
Num ataque do time paulista, a bola é rebatida pelo guarda-metas. O argentino Martinez prepare-se para arrematar quando é derrubado por um adversário.
O árbitro assinala pênalti. No emaranhado de situações, ele e o auxiliar não puderam ver que atleta corinthiano se encontrava em impedimento quando do chute que originou a jogada.
Irregularidades como essa ocorrem aos montes, todos os dias, nos jogos disputados no campo de várzea do Vila Mafra e também nas pomposas arenas europeias, como Wembley e Camp Nou.
O próprio Botafogo só obteve seu único título brasileiro, em 1995, por conta de uma arbitragem desastrosa do polêmico Marcio Rezende de Freitas.
Sader não foi capaz de considerar corriqueiro o fato. Imediatamente, decretou a culpa do árbitro e de seu auxiliar, incluindo-os num suposto esquema de fabricação de resultados.
Curioso é que os mesmos críticos de Joaquim Barbosa, o intempestivo juiz do STF, repitam no cotidiano aquela que é considerada sua prática mais reprovável: condenar por impulso ou conveniência.
Se Sader tivesse lançado olhos aos "autos", veria que o Corinthians é, no Brasileiro 2012, justamente o time MAIS PREJUDICADO pelas arbitragens.
Não fossem os erros de arbitragem, teria sete pontos a mais, saltando do oitavo para o quarto lugar na classificação geral, conforme atesta o Placar Real (www.placarreal.com.br).
Em seu debate com Monica Toledo, o intelectual Sader reproduz a tática de desqualificação e generalização que tanto critica na propaganda eleitoral de ícones da direita, como o tucano José Serra.
Ele afirma, com convicção, que vários presidentes do Corinthians estavam alinhados com as forças conservadoras, como Wadih Helu.
Uma verdade, sem dúvida, mas que não define o objeto de análise. Seria o mesmo que desqualificar os brasileiros por, na mesma época, terem sido governados por Costa e Silva e Médici.
Convém lembrar que durante os anos de Helu o Corinthians não conquistou títulos. Viveu-se nessa época o grande jejum, que ao todo durou 22 anos, de 1954 a 1977.
Sader, obviamente, não conhece a história do Corinthians. Não sabe que foi fundado como o clube dos excluídos, dos operários, dos carroceiros, dos braçais e das lavadeiras.
Sader não sabe (e deveria saber, como homem de tantas sociologias) que a fundação do clube reflete a busca por protagonismos na São Paulo em industrialização.
Sader não descobriu a forte influência do anarquismo humanista na construção do sonho corinthiano. Certamente, não sabe que os pioneiros liam La Battaglia e ouviam lições da Escola Libertária Germinal.
O Corinthians é grande e popular. E nunca porque algum governo o beneficiou. Cresceu justamente por representar um "não" ao poder estabelecido das elites bandeirantes.
Se Sader tivesse rigor em suas análises, procuraria saber o que ocorreu na partida entre o alvinegro e o Ypiranga, logo após o fim da Greve de 1917.
Sader conviveu com Sócrates e aprendeu apenas o que julgou conveniente. É evidente que os ex-jogador criticava as gestões conservadoras no clube.
Porém, o Doutor também valorizava o ethos libertário corinthiano. Segundo ele, somente no clube poderia surgir a Democracia Corinthiana.
Sem dúvida, existem burgueses corinthianos, porque a instituição imaginada pelo ex-funcionário da Light e alfaiate Miguel Bataglia pretendeu sempre gerar comunhões de amor.
Os fundadores pensavam em cooperações ativas, em solidariedades, em miscigenações, em universalização de direitos.
Por isso, um time modesto da várzea logo arregimentou tantos militantes, tão saudavelmente diversos. Por isso é gigante. Por isso, move e comove milhões de brasileiros, inclusive Luiz Inácio da Silva.
Fosse mais atento e diligente, Sader descobriria que os primeiros movimentos públicos do Partido dos Trabalhadores, em seu berço paulista, adaptavam palavras de ordem e coreografias do Corinthians.
Talvez seja o momento de Sader rever seus conceitos. Muitos dos predicados do PT original tinham raízes num jeito de ser corinthiano. Perdidos, conduzem a agremiação para o canal raso da política convencional.
Walter Falceta Jr. é jornalista
Brigada Miguel Bataglia

2 comentários:

Fernando Romano Menezes disse...

Às favas com a modéstia, mas creio que uma humilde frase, cunhada por mim, permanece e sempre permanecerá verdadeira: "Todo anticorinthiano tem um pouco de fascista. Até mesmo os de esquerda."

Alexandre disse...

O Palmeirinha da Turiaçu tem hoje mais uma partida de vida ou morte, em sua tragicômica luta contra mais um rebaixamento. E a imprensa, de modo canalha, volta todos os holofotes para o jogo do Corinthians.

Corinthians que, mesmo sendo o melhor time do Brasil,´faz figuração no Brasileirão - ocupado que estava, no início do torneio, com a campanha do título invicto da Libertadores; e focado que está, faz tempo, na preparação para a disputa do Mundial em dezembro.

Cobra-se do Corinthians "empenho", "luta", "dignidade"... Insinua-se "corpo mole", "entrega", "facilitação"... Nas redes sociais e comentários da internet, alguns "corinthianos" sem rosto falam "tem que entregar mesmo!" (significativamente, não se vê reportagens em que sejam mostrados corinthianos reais declarando que vão torcer contra o seu time - ao contrário do que ocorreu, nos anos recentes, sempre que a facilitação de partidas seria em prejuízo do Corinthians, quando anticorinthianos, explícita e desavergonhadamente, se mostraram em campanha para seus times amolecerem para os adversários, chegando a ameaçar os jogadores que se empenhassem para valer).

Assim, mesmo que a Fiel marque presença no estádio, apoie o Timão, o Corinthians lute, e ainda assim o time perca, surgirão as acusações caluniosas de "entrega" - como aconteceu naquele jogo contra o Flamengo, em 2009.

Ainda que o adversário seja escandalosamente ajudado pela arbitragem - como aconteceu naquele jogo contra o Flamengo, em 2009.

Ainda que time e torcida irritados com a derrota e com a arbitragem facciosa - como aconteceu naquele jogo contra o Flamengo, em 2009.

O Corinthians, vítima da escandalosa campanha do "entrega", em 2010 - que, devido a seu sucesso, resultou na festa recalcada dos anticorinthianos, pelo que chamaram de "Cem ter nada" - terá que
jogar hoje, mais do que por si, pelo maior rival (aquele que melhor expressa o difuso sentimento anticorinthiano - não é à toa que "a inveja é verde").

O Corinthians, condenado ao rebaixamento, em 2007, pela "Vergonha do Serra Dourada", o infame jogo entre Goiás e Entregacional - rebaixamento que resultou na explosão de júbilo anticorinthiano pelo que consideraram um golpe de morte na instituição que tanto invejam e odeiam - terá que
jogar hoje, mais do que por si, pelo maior rival. (aquele que melhor expressa o difuso sentimento anticorinthiano - não é à toa que "a inveja é verde").

É o fim da picada.

Pois o Corinthians tem é que jogar, hoje, única e exclusivamente por si. Se ganhar, será mais uma vitória do Timão, razão de viver de tantos fiéis. Se não ganhar, a Fiel continuará a apoiar o Coringão, como sempre fez, e como faz especialmente no presente, em reconhecimento a um time que é campeão brasileiro e das Américas - invicto, é sempre importante que se ressalte - e que joga e luta como os melhores times corinthianos em mais de 100 anos de história.